Provedor que derrubou site nazista pode ser julgado por pirataria

Provedor que derrubou site nazista pode ser julgado por pirataria

Provedor que derrubou site nazista pode ser julgado por piratariaO provedor de distribuição de conteúdo CloudFlare pode ir a julgamento por pirataria nos Estados Unidos e um dos principais argumentos da ALS Scan, a produtora de conteúdo pornográfico que moveu a ação, envolve a derrubada de um site neonazista, o Daily Stormer. O site utilizava os serviços da CloudFlare, mas foi derrubado em agosto de 2017, algo muito incomum para a CloudFlare. O provedor costuma manter vários sites questionáveis entre seus clientes, inclusive os de pirataria, sob o argumento de que não hospeda o conteúdo.

A CloudFlare tentou alegar para o tribunal que o Daily Stormer não era relevante para o julgamento do júri e que, por envolver conteúdo neonazista, o caso teria um apelo emotivo indevido. O juiz George Wu, da corte californiana onde o processo tramita, negou o pedido da CloudFlare e a ALS Scan recebeu o sinal verde para usar o Daily Stormer em sua argumentação.

A CloudFlare é um provedor de serviços de internet que fornece proteção contra ataques de negação de serviço e serviços — ataques que tentam tirar um site do ar — e uma rede de distribuição de conteúdo (CDN). Uma CDN é formada por servidores distribuídos por todo o planeta para acelerar o acesso a páginas — acessar um servidor mais próximo é mais rápido do que acessar um servidor mais distante — e, para isso, esses servidores armazenam apenas cópias temporárias e parciais dos sites.

A CloudFlare diz não ser responsável por qualquer dano cometido por sites de clientes, pois a empresa apenas atua como uma “ponte de acesso” ao conteúdo armazenado no provedor principal de hospedagem do cliente. Este, sim, armazena cópias completas e permanentes dos sites e deve ser procurado para derrubar o conteúdo.

Mas a ALS Scan alega que a CloudFlare não tem direito às proteções legais concedidas aos provedores de serviços de internet, como o Google, Facebook e provedores de internet e hospedagem de sites. A produtora argumenta que a CloudFlare faz cópias não autorizadas de material protegido por direito autoral quando armazena cópias temporárias do conteúdo em seus servidores e que a empresa é conivente com as infrações cometidas por seus clientes ao se negar cancelar os serviços a sites de pirataria.

Como parte da proteção a ataques de negação de serviço, a CloudFlare também tenta omitir o endereço de internet (endereço IP) verdadeiro dos seus clientes, o que impede que detentores de direitos autorais tomem medidas contra os provedores de hospedagem desses sites.

Entre os clientes da CloudFlare está o The Pirate Bay, um site bastante conhecido no ramo da pirataria. Mas há diversas outras páginas de conteúdo ilícito nos servidores Especialistas chegaram a criar um site chamado “Crimeflare” para tentar identificar os endereços verdadeiros de clientes da CloudFlare – principalmente sites de conteúdo ilícito -, mas a página era bastante incompleta e já não está mais on-line.

Um dos pilares no argumento da CloudFlare era o de que a empresa não derrubava nenhum site sem ordem judicial. Como ela não é o provedor de serviços primário dos sites, cancelar o serviço da CloudFlare não derrubaria esses sites. A regra valia para todos os clientes, mas a lei norte-americana de direito autoral exige que material protegido seja retirado do ar após notificações, dispensando a necessidade de ordem judicial.

Em agosto, quando a CloudFlare derrubou o site neonazista Daily Stormer, o argumento ficou prejudicado. A atitude demonstrou que o cancelamento do serviço por parte da companhia pode ter um efeito direto na disponibilidade de uma página web. O site de tecnologia Gizmodo obteve um comunicado interno da empresa enviado por Matthew Prince, o CEO da CloudFlare, em que ele deixa claro não só que ele pode tirar algo do ar, mas fazer isso de forma arbitrária.

“Hoje acordei de mau humor e decidi chutar o Daily Stormer para fora da internet”, escreveu Prince.

Desde então, Prince admitiu para sua equipe que tirar o Daily Stormer do ar foi realmente uma decisão arbitrária e que a atitude não se repetiria. Para a imprensa, a companhia também tentou argumentar que o Daily Stormer só foi retirado do ar porque a página tentou implicar a CloudFlare — afirmando que ela era uma “apoiadora secreta” de suas visões políticas. Não está claro qual será a estratégia da companhia no tribunal agora que a tentativa de censurar o caso na corte fracassou.

Além da CloudFlare, o Daily Stormer também foi derrubado pela GoDaddy. A página é atualmente hospedada pelo provedor de hospedagem francês OVH e se intitula “o site mais censurado da internet”.

‘Serviço inteligente’
Embora a CloudFlare se diferencie de muitos provedores de serviços ao exigir uma ordem judicial para derrubar sites de clientes, um dos argumentos da ALS Scan, o de que a CloudFlare não merece as proteções da lei por ser um “serviço inteligente”, pode implicar outros prestadores de serviços.

A lei norte-americana protege provedores de serviços de internet e comunicação em diversas categorias e desde que eles cumpram certas exigências. Uma delas é entendida como um tratamento neutro de conteúdo.

Desde 1998, quando a lei norte-americana de “direito autoral digital” foi criada, serviços de internet têm adotado cada vez mais mecanismos “inteligentes” para tirar melhor proveito da infraestrutura de rede e atender às demandas de consumidores. Essas práticas, embora corriqueiras e de finalidade estritamente técnica, podem não ser vistas como “neutras”.

Se o júri condenar a CloudFlare e concordar com esse argumento, outros prestadores de serviços, mesmo aqueles que derrubam conteúdo após serem notificados, podem ficar em risco de perderem suas proteções legais.

Dúvidas sobre segurança, hackers e vírus? Envie para g1seguranca@globomail.com

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